O policial reformado e advogado Mizael Bispo de Souza foi condenado nesta quinta-feira (14) a 20 anos de prisão pelo assassinato da ex-namorada, a advogada Mércia Nakashima, ocorrido em 23 de maio de 2010. O corpo e o carro da advogada foram encontrados em uma represa na cidade de Nazaré Paulista, na Grande São Paulo. Mércia foi morta aos 28 anos.
- O corpo de Mércia Nakashima foi encontrado em junho de 2010 em uma represa de Nazaré Paulista
Na leitura da sentença, o juiz Leandro Bittencourt Cano descreveu os três agravantes aceitos pelo Conselho de Sentença ao analisar se o réu era inocente ou culpado.
Sobre o agravante de crime torpe, por exemplo –segundo a acusação, Mizael se sentia humilhado pelo fim do relacionamento–, o magistrado definiu: “muitos crimes são cometidos em nome do amor, que mas que tipo de amor é esse?”, indagou, para completar: “Quando é amor o que se sente, não há o mínimo desejo de se livrar da pessoa amada. O sentimento amor não faz sofrer. O instinto de propriedade, esse faz sofrer”, classificou.
Ao final, o juiz fez a leitura dos agradecimentos com a voz embargada. Ao todo, foram quatro dias de júri no Fórum de Guarulhos (Grande SP). Pela primeira vez no Estado de São Paulo e pela segunda vez no país um julgamento foi transmitido em áudio e vídeo ao vivo.
Após a leitura da sentença, Claudia Nakashima, irmã de Mércia que acompanhava o julgamento, gritou “assassino maldito!” a Mizael, que já voltou ao presídio militar Romão Gomes –onde estava desde o ano passado– após deixar o prédio do fórum.
Mizael foi condenado por um júri de cinco mulheres e dois homens.
Ao todo, os jurados analisaram seis quesitos para responder sim ou não e decidir se o policial reformado era ou não culpado pelo crime. Entre eles, figuraram, por exemplo, se o réu “concorreu para o crime”, se “o jurado absolve o acusado” e se o crime foi praticado “por motivo torpe, em razão da insatisfação com o rompimento” do relacionamento amoroso. Ainda foi questionado aos jurados se houve emprego de “meio cruel” à vítima.
Pela autoria, foram quatro votos a zero. Pelos dois primeiros agravantes (motivo torpe e emprego de meio cruel), 4 a 1, e pelo terceiro agravante (crime com recurso que impossibilitou ou dificultou a defesa da vítima), placar de 4 a 0.
Pena dentro do esperado
O promotor do caso, Rodrigo Merlin, havia solicitado a condenação pela pena máxima –30 anos. Mesmo assim, ele avaliou a sentença final como “dentro do esperado”, tomando por base outros julgamentos dos quais participou com o mesmo juiz do caso Mércia.
“Esperava que saísse algo entre 20 e 25 anos”, disse. “Cinquenta por cento do caso está resolvido. O segundo tempo fica para o dia 29 de julho”, afirmou Merlin, que se declarou “com a sensação de dever cumprido”.
O promotor se refere ao outro acusado pelo crime, o vigia Evandro Bezerra da Silva, que está preso no presídio de Tremembé 2 e vai a júri popular em 29 de julho deste ano. Inicialmente, o vigia seria julgado com Mizael, mas o júri foi desmembrado a pedido da defesa de Bezerra, que alegava tese conflitante entre os dois acusados.
O promotor justificou que abriu mão da uma hora de réplica a que tinha direito “porque a defesa resolveu atacar autoridades e falou muito pouco do processo”. Se aceitasse a réplica, a defesa do réu teria também uma hora para tréplica.
Magistrado
O juiz Leandro Cano enfatizou, na sentença, que o réu mentiu diante do júri que era inocente.
Durante a leitura da sentença, o magistrado disse: “com o devido respeito, não se pode tolerar o perjúrio. A verdade é sempre o valor defendido pelo Estado. Se o réu não é obrigado a falar, está claro que não precisa mentir. A mentira tem por escopo iludir os jurados”.
Foi por isso que ontem, após Mizael ser interrogado, perguntou ao réu se tudo que ele havia dito era verdade ou mentira.
Questionado sobre a razão de ter ficado com a voz embargada durante a leitura, admitiu: “foi um peso que saiu das minhas costas. Foi mais de um mês de preparação. Eu tenho sentimentos”.
Defesa
Um dos advogados de defesa de Mizael, Ivon Ribeiro, disse aos jornalistas que “provavelmente” vai recorrer da sentença. “Provavelmente, vamos pedir novo júri, mas não há nada decidido”, falou.
Ribeiro afirmou que pode estudar pedir a diminuição da pena pelos agravantes de mentira e personalidade do réu. Na sentença, o juiz Cano classificou Mizael como agressivo, covarde e frio e aumentou a pena em dois anos por isso.
A transmissão ao vivo, segundo o advogado, não influenciou e até deu um certo vigor para a defesa.
Testemunhas
Ao todo, os jurados ouviram os depoimentos de nove testemunhas –cinco da acusação, três da defesa (que dispensou outras duas) e uma do juízo– e o interrogatório do réu, que falou nesta quarta-feira (14) apenas respondendo a perguntas da defesa, uma vez que o promotor do caso, Rodrigo Merlin Antunes não quis inquiri-lo.
Entre os depoimentos, se destacaram o de Márcio Nakashima, irmão da vítima, e o do delegado Antonio Assunção de Olim, responsável pela investigação do caso. Ambos foram arrolados pela acusação.
Márcio, primeira testemunha a ser ouvida no júri, na última segunda-feira (11), chorou em vários momentos das cerca de quatro horas em que depôs e discutiu rispidamente com os advogados de Mizael, os quais acusou de macular a reputação da advogada, e acusou o réu de ter se “transformado” no segundo ano de namoro com Mércia.
“Mizael era muito ciumento, possessivo e se transformou. Ele ligava várias vezes para a Mércia”, afirmou Márcio, que, alegando medo, pediu para que o réu fosse retirado do plenário durante o depoimento. Como é advogado e trabalha em sua própria defesa, o réu pediu para continuar na sala, mas o juiz negou.
Delegado derruba álibi
Já o delegado do caso, ouvido na terça-feira (12), derrubou a tese do réu de que teria se encontrado com uma prostituta no momento em que a advogada era assassinada em Nazaré Paulista.
Mizael alega que, na noite do crime, esteve por quatro horas com uma prostituta, dentro de um carro, em frente ao Hospital Geral de Guarulhos.
“Ele não sabia o nome da mulher e, só depois de muita pressão, lembrou a cor do cabelo. Depois deu apenas R$ 20. Além do que, é estranho transar em um lugar de tanto movimento, sem chamar a atenção”, disse o delegado, que foi taxativo aos jurados: “Eu não tenho dúvida nenhuma de que Mizael matou Mércia”, declarou.
Depoimentos de peritos
Tanto defesa quanto acusação também lançaram mão de peritos para testemunhar em plenário.
O perito-chefe da investigação do caso, Renato Domingos Pattoli, por exemplo, falou na quarta-feira (13) e viu a defesa do réu tentar desqualificar a perícia feita pelo Instituto de Criminalística à época do crime.
O perito explicou que a terra encontrada no sapato de Mizael não era compatível com a encontrada na represa de Nazaré Paulista, onde o corpo de Mércia foi encontrado.
“A quantidade de terra encontrada era pequena, mas dá para afirmar que não era compatível”, disse.
Outro perito do caso, o biólogo Carlos Eduardo Bicudo, ouvido como testemunha no primeiro dia de julgamento, disse que algas não se fixam na terra, e sim, em um substrato. Por isso, a terra e a alga encontradas no sapato de Mizael podem ter vindo de locais diferentes.
Fonte: Uol
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